ONU diz que emissão de gases pode ultrapassar limite para 2020
Cumprimento de acordos climático não é suficiente, diz relatório.
Pnuma aponta que são necessários mais investimentos 'verdes'.
Relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) divulgado nesta quarta-feira (21) alerta que, mesmo se os países aplicarem até 2020 políticas públicas que ajudem a reduzir a emissão de gases de efeito estufa, o limite máximo proposto pelos cientistas para aquela data terá sido ultrapassado.
Esse limite representa para a ciência climática estagnar a elevação da temperatura global em, no máximo, 2 ºC acima dos níveis pré-industriais ainda neste século.
De acordo com o relatório “A lacuna das emissões”, em tradução livre do inglês, mesmo que todos os países cumpram nos próximos oito anos o que foi prometido em acordos climáticos firmados em conferências da ONU, delineados dentro da Convenção da ONU para Mudança Climática (UNFCCC, na sigla em inglês), eles ainda emitiriam 8 bilhões de toneladas (gigatoneladas) de gases a mais que o limite proposto para 2020.
O teto de emissões fixado por cientistas para 2020 é de 44 gigatoneladas de CO2 equivalente (medida que soma a concentração de dióxido de carbono, metano, óxido nitroso e outros gases).
No entanto, há um cenário pior, caso nada seja feito. Se nos próximos oito anos nenhum governo cumprir o que prometeu e as políticas verdes deixarem de ser vistas como prioridade - acrescentando ainda o desenvolvimento econômico previsto para o período, as emissões de gases ultrapassariam em 14 gigatoneladas o limite calculado pelos cientistas.
Em comunicado, Achim Steiner, subsecretário-geral da ONU e diretor do Pnuma, disse que a transição para uma economia de baixo carbono e uma economia verde inclusiva ainda acontece de forma lenta “e que a oportunidade de alcançar o alvo de 44 milhões de toneladas de CO2 equivalente diminui anualmente”, explica.
Mas ainda há solução, diz especialista
Segundo o brasileiro Ronaldo Seroa da Motta, pesquisador da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e um dos autores do estudo, o relatório apresenta formas de como os países podem evitar o lançamento de gases excedentes se utilizarem como políticas públicas exemplos implementados e que já auxiliam na criação de uma economia global sustentável.
“Países já tomaram iniciativas por conta própria e essas políticas levaram a grandes reduções de emissões (...). A ideia é ampliar essas experiências, expandindo-as para níveis nacionais. A mensagem do relatório é que estamos ameaçando a trajetória que tenta evitar a elevação da temperatura, mas, mesmo com isso, há políticas que podem auxiliar na redução das emissões”, disse Motta ao G1.
De acordo com o estudo, com investimentos que reduzem o impacto ambiental em setores como a construção, geração de energia e transporte, é possível evitar a emissão de um total de 17 gigatoneladas de gases até 2020.
Construções e transporte verdes
O capítulo que cita projetos já realizados em alguns países mostra que no setor da construção civil é possível reduzir de 1,4 a 2,9 gigatoneladas de gases com a criação de habitações que colaborem mais com o meio ambiente.
As residências teriam de ser mais eficientes do ponto de vista energético (com a provável aplicação de matrizes renováveis, que usam o vento ou o sol para gerar eletricidade), reduzir gastos com ar condicionado ou aquecimento, além de controlar o fluxo de água, com a aplicação de sistemas de reuso e escoamento de efluentes.
O relatório cita, por exemplo, o caso da implementação do sistema BRT (Bus Rapid Transport) na Cidade do México. Em operação desde 2005, o BRT opera linhas que cobrem 95 km da capital mexicana, atendem 687 mil passageiros por dia e, segundo a ONU, evitam a emissão de 143 mil toneladas de CO2. No Brasil, Curitiba e Rio de Janeiro já operam esse sistema de transporte coletivo.
Todo investimento tem que ser feito até 2020 (...). Se nada for feito
agora, [cortar o lançamento de gases] ficará muito mais caro"
Ronaldo Seroa da Motta, pesquisador da UERJ e um dos autores do relatório do Pnuma
Outro ponto citado por Motta no relatório é sobre redução de emissões por desmatamento e degradação (Redd), no qual se destacam o Brasil e a Costa Rica. Segundo ele, o controle de desmatamento de florestas no Brasil é exemplo devido à combinação de “decisões políticas, reforço institucional e grande capacidade de monitoramento”, disse.
Dado de 2011 do sistema conhecido como Prodes (Projeto de Monitoramento do Desflorestamento na Amazônia Legal), operado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe, apontou que a Amazônia Legal teve o menor índice de desmatamento dos últimos 23 anos, com uma perda de cobertura vegetal de 6.418 km² entre agosto de 2010 e julho de 2011 – uma área equivalente a quatro vezes o tamanho da cidade de São Paulo.
Na época, o governo federal afirmou que havia sido a menor taxa desde que o instituto começou a fazer a medição, em 1988, com uma redução de 8% em relação ao mesmo período em 2009 e 2010.
Apesar do resultado positivo da política brasileira, Motta aponta a Costa Rica, um país com pouco mais de 4,3 milhões de habitantes, como um exemplo mais eficaz no combate à degradação florestal. O país já conseguiu estancar as taxas de desmatamento e agora investe no pagamento de serviços ambientais, tipo de política pública na qual, segundo o especialista, o Brasil precisa investir mais.
“Sabemos que a Costa Rica avançou muito mais até por ser um país pequeno. Mas já temos iniciativas no Brasil, como o Bolsa Verde e o Bolsa Floresta (projetos que pagam para a população ribeirinha preservar áreas de proteção). Mas é necessário um projeto nacional que deve ser customizado regionalmente. O importante é que temos iniciativas, mas talvez precisemos acelerar mais a implementação delas”, explica.
Ainda segundo Motta, o momento de crise econômica que afeta parte do globo tem que ser visto como "uma janela de oportunidade" para a tecnologia limpa. "Todo investimento tem que ser feito até 2020. Depois dessa data, mais emissões terão que ser reduzidas de forma ainda desconhecida. Se nada for feito agora, [cortar o lançamento de gases] ficará muito mais caro", finalizou.
Imagem aérea mostra desmatamento na Amazônia (Foto: Divulgação/Toby Gardner/Science)
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